quarta-feira, maio 27, 2009

A nova era dos Festivais

A Nova Era dos Festivais
Como nos anos 60, os novos talentos da MPB explodem em shows coletivos pelo Brasil afora. Praticamente ignorado pela TV, o fenômeno arrasta um público estimado em 250 mil pessoas por ano
Por José Flávio Júnior
Fonte: http://bravonline.abril.com.br/conteudo/musica/nova-era-festivais-467150.shtml
• O editor de música José Flávio Junior apresenta em seu podcast as apostas para esse ano nos festivais


Exaltar a era dos festivais — onde surgiram grandes nomes da MPB como Caetano Veloso e Chico Buarque — é um argumento clássico dos saudosistas. Bem, agora eles não têm mais do que sentir saudade: a era dos festivais está de volta. Nunca houve tantos festivais de música popular no Brasil, nem mesmo no tempo em que Nara Leão usava saia acima do joelho e Sérgio Ricardo atirava o violão na plateia. Em geral realizados em capitais brasileiras fora do eixo Rio-São Paulo, pelo menos 38 são vinculados à Abrafin, Associação Brasileira de Festivais Independentes (sim, existe até uma entidade que reúne dados sobre o assunto). De acordo com a Abrafin, em 2008 cerca de 800 artistas se apresentaram em eventos como o Bananada — cuja próxima edição ocorrerá neste mês em Goiânia —, o Rec-Beat, em Recife, e o Calango, em Cuiabá. Estima-se que tenham reunido, ao todo, um público da ordem de 250 mil pessoas.

No essencial, os festivais do século 21 têm a mesma função dos realizados na década de 1960: revelar novos talentos. No restante, e a começar pelo fato de que não são competitivos, são completamente diferentes. Essas diferenças estão ligadas às mudanças que o mundo da música experimentou nos últimos anos. A década de 60 do século passado foi o período em que a televisão se consolidou como principal meio de divulgação de música popular, superando o rádio. Os festivais eram promovidos por emissoras como a Tupi e a Excelsior. Quando apareciam na televisão, artistas como Caetano Veloso e Chico Buarque passavam a fazer parte de uma espécie de mainstream da música e, assim, conseguiam contratos com grandes gravadoras. Hoje o conceito de mainstream não existe mais. A internet vem substituindo o rádio e a televisão como principal meio de divulgação de música. As gravadoras enfrentam dificuldades financeiras, e os artistas, novos ou não, sobrevivem sobretudo de shows. É justamente esta uma das principais funções dos novos festivais: ver quem se sai bem no teste do palco.

O presidente da Abrafin, Fabrício de Almeida Nobre, de 30 anos, é vocalista da banda de rock goiana MQN. Colocou de pé seu primeiro festival porque queria um palco para tocar. O evento que ele tinha como modelo era o pernambucano Abril pro Rock, uma espécie de precursor da nova era dos festivais, que acaba de realizar sua 18ª edição. Contemporâneo do movimento manguebit, o APR revelou de cara Chico Science e Mundo Livre S/A. Em anos seguintes, deu visibilidade a grupos como Mombojó e Los Hermanos. Hoje, o festival não atravessa sua melhor fase, apresentando uma programação bastante enxuta e menos atraente do que a dos "rivais" Rec-Beat e o No Ar Coquetel Molotov, ambos sediados em Recife.

Para Fabrício, uma das principais contribuições da Abrafin foi ajudar a formatar um calendário nacional de festivais. As datas dos eventos são publicadas no site da associação (www.abrafin.org), que também explica os conceitos de cada festival e informa quem são seus responsáveis. Ainda que a crise mundial tenha empurrado para o segundo semestre vários eventos que deveriam ocorrer no primeiro, ela não ameaça a continuidade dos que já estão estabelecidos. "A melhor definição para um festival independente é: independentemente do que aconteça, ele acontece", diz Fabrício.

Para uma banda iniciante, os festivais podem ser estratégicos, uma vez que reúnem tribos distintas na plateia. O grupo de rock Móveis Coloniais de Acaju, de Brasília, resolveu em 2005 que investiria tudo nesse circuito, com os nove integrantes custeando o alto preço das viagens. A banda começou tocando, nos piores horários, em festivais como o extinto Curitiba Rock Festival. Graças a performances interativas e arrebatadoras, o Móveis foi conquistando fãs e hoje é chamado para ser a atração principal em vários eventos. Os produtos com o logotipo do grupo disponíveis nas barraquinhas vão de abridores de garrafas até espelhinhos femininos. Tanto destaque nessa cena rendeu um contrato com a gravadora Trama, que lança o segundo álbum dos brasilienses neste mês (leia a resenha na página 49).

Muitos desses festivais nasceram totalmente dedicados ao rock. Mas outras expressões musicais — muitas regionais, caso do tecnobrega e da guitarrada no Se Rasgum, de Belém, e do siriri e do cururu no Calango, de Cuiabá — foram ganhando espaço, sem alienar os adeptos do som mais pesado. É o inverso do que aconteceu nos festivais dos anos 60, cuja audiência rechaçava flertes com a "música americana". No Festival Internacional da Canção de 1968, Caetano Veloso lançou uma diatribe contra os que o apupavam durante a execução de É Proibido Proibir, em ruidoso arranjo dos Mutantes. Ficou famosa a passagem "Mas é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder? Vocês não estão entendendo nada!". Que bom que Caetano está vivo para ver que o futuro é muito melhor do que aquele previsto em seu discurso. A juventude entendeu tudo. E está fazendo acontecer.

ONDE E QUANDO
Festival Bananada. Centro Cultural Martim Cererê (rua 94-A, Setor Sul, Goiânia, GO, tel. 0++/62/212-5315), a partir das 17h. Dias 22, 23 e 24. R$ 20 (por dia). www.myspace.com/bananada

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